Já algumas vezes pensei que seria melhor ser uma pedra tão dura como uma rocha circundante ao mar com uma grandeza inconfundível, que apenas se deixa lascar com o passar dos anos. Não sou… nem grande… nem dura.
A minha sensibilidade ajuda-me a ser tocada por uma frase, por um gesto, por um sorriso e, principalmente, por um olhar. Emocionar-me não é difícil. Deixar-me envolver por histórias, por verdades e, essencialmente, por sentimentos é tão bom como comer um crepe com chocolate ao olhar para o pôr-do-sol num dia de Outono. Claro está, que quando nos envolvemos também sofremos, mas quando não o fazemos, esquecemo-nos de dar ao outro e olhamos para um umbigo que nos pertence e não consegue nunca chegar tão perto de alguém como esse alguém tanto merece.
Amar as pessoas, amar o outro, ver as qualidades do ser humano sempre num primeiro plano é, genuinamente, colocar a sensibilidade ao serviço das pessoas e utilizá-la para fazermos nascer sorrisos.
Ser sensível é, na minha opinião, ser corajoso. A coragem é uma virtude ou um defeito? Por vezes a coragem pode bloquear-nos no nosso Eu, naquilo que queremos para nós e leva-nos a sensibilidade, mas tal como as moedas também nesta perspectiva existe um outro lado. Ser sensível exige uma coragem desmedida. Cada gesto pode levar-nos ao abismo e saber lidar com a nossa própria sensibilidade exige um trabalho interior e exterior de desbloqueamento e avanço para um outro nível.
Recentemente os meus olhos brilharam. Talvez tenha conseguido sentir o brilho de alguém que me tocou, que interiorizei, reflecti e elaborei. E qual foi o resultado final? O brilho dos meus olhos iluminou o meu dia de uma forma quase natural, sem qualquer esforço.
Contudo os meus olhos também têm momentos mais baços. São o reflexo de um sentir cinzento, que reflicto, senti e elaboro. Por vezes não consigo sorrir. O sofrimento do próximo é tão grande que os dias tornam-se cinzentos. É o que penso até ao momento em que percebo que o meu Eu não vai poder trazer nada de novo ao outro se me deixar contagiar pela sua falta de brilho.
Há olhos no Mundo que brilham para me alcançar e de tanto brilharem me tocam pela sua ingenuidade e sensibilidade. E outros há, que de tão cinzentos me tocam no sofrimento e de repente vivo de uma forma intensa a dor do peito do outro.
A sensibilidade é isto mesmo. É ter coragem para sentir e viver o outro dentro de nós. Hoje só queria poder viver dentro de mim alguém com uns olhos brilhantes e iluminados, mesmo que esse alguém não tivesse consciência nenhuma do seu próprio brilho.
Afinal a vida é feita de momentos mas para os conseguirmos viver temos de deixar que experimentem as diferentes chaves de um cofre, por vezes fechado, mas jamais fechado para sempre. E depois????Depois, quando o cofre está aberto é possível guardar coisas novas dentro dele...ainda bem que há pessoas que insistem em não desistir de abrir cofres à primeira tentativa falhada. Ainda bem que há pessoas com poderes desbloqueadores, pessoas que através de um gesto, de uma frase ou de uma partilha nos trazem de volta à vida tal como é...nua, crua e dura mas saborosa!
